Por Vanderlei de Lima 14/08/2011
No dia 22 de julho, torcidas organizadas do Estado assinaram, em São Paulo, num evento que, salvaguardadas as devidas proporções, parecia uma cerimônia da corte inglesa, o TAC, Termo de Ajustamento de Conduta. Ele é um documento extrajudicial assinado por duas partes tendo em vista o ajuste de condutas que contrariam a lei. No caso em questão, de um lado está o Ministério Público como “tomador de compromisso” e, de outro, as torcidas como “compromitentes”. Em outras palavras: o Ministério Público impôs uma medida e as torcidas têm que cumpri-la sob pena de sofrerem pesada multa, de serem proibidas de adentrarem aos estádios e de terem que responder a processo judicial por meio de Ação Civil Pública.
Daí a questão crucial, ainda que em aspectos genéricos: por que o TAC foi aplicado aos torcedores organizados? Porque enquanto muitas torcidas literalmente brigavam entre si, desviando-se de sua reta finalidade legal – que veremos logo mais qual é –, as autoridades constituídas realizavam um trabalho minucioso que resultaria em medidas radicais a serem seguidas por todas as organizadas. Sim, o promotor Paulo Sérgio de Castilho preparou, com a ajuda de torcedores, de políticos e de intelectuais, boa parte dos 45 artigos do Estatuto do Torcedor de 27 de julho de 2010 que vai sendo aplicado com o auxílio de diversos métodos coadjuvantes, dentre os quais o TAC.
Desse modo, é possível ver que o Termo de Ajustamento de Conduta foi implantado às organizadas, conforme se lê no livro Ações práticas e propostas legislativas de combate à violência no futebol, do promotor Castilho, p. 26, porque “por conta de campeonatos estaduais, nacionais e internacionais, realizados na Capital e em cidades do interior do Estado, frequentemente, integrantes de torcidas organizadas entram em confrontos físicos e violentamente agridem-se mutuamente, o que resulta em ferimentos e até morte de torcedores e policiais militares, bem como em depredação de estádios, muitos deles públicos, ocasionando dano ao patrimônio público [...]”.
Pois bem, com base nessa descrição, o Estado resolveu pesar a mão contra o desvio de finalidade de algumas torcidas. Daí a pertinência das perguntas: de acordo com o Estatuto, quem é o torcedor? O que é uma torcida organizada? “Torcedor – diz o art. 2º – é toda pessoa que aprecie, apóie ou se associe a qualquer entidade de prática desportiva do País e acompanhe a prática de determinada modalidade esportiva”. Note, prezado leitor, que aí figuram os verbos apreciar, apoiar e associar-se, mas não brigar, provocar, etc. Vem apresentado, a seguir, o papel das torcidas organizadas no art. 2º-A: “Considera-se torcida organizada, para os efeitos desta Lei, a pessoa jurídica de direito privado ou existente de fato [sem registro de acordo com o Código Civil, art. 45 – nota minha], que se organize para o fim de torcer e apoiar entidade de prática esportiva de qualquer natureza ou modalidade”. Não se vê aqui o direito de promover tumultos. Aliás, o tumulto – em suas várias modalidades – é infração punida pelo art. 41-B do referido Estatuto que castiga não só os estúpidos, mas, solidariamente, a Torcida que ele faz parte (art. 39-B).
Restam, portanto, três grandes medidas a serem tomadas pelas torcidas, individualmente ou em confederações: 1) Servir-se de palestras de intelectuais para saberem o que se passa no âmbito jurídico-político; 2) Formar seriamente os seus associados para o amor ao Clube e o respeito (e não o ódio) ao torcedor rival; 3) Promover o diálogo sincero entre as cúpulas e as bases das diversas organizadas para, mutuamente, evitarem confrontos. É à luz destas reflexões que a Toppaz, Torcida Organizada Pela Paz, convida as organizadas sérias para um diálogo sincero e eficaz ante o ataque do TAC.
A propósito indicamos a leitura do livro Estatuto do Torcedor Comentado, de Luiz Flávio Gomes e outros. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
*Vanderlei de Lima é professor, filósofo, com curso de Extensão em Direito e Punição pela PUC-Campinas, autor de livros sobre Organizadas e dirige a TOPPAZ, Torcida Organizada Pela Paz, .